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Teste: Aníbal F100 Podadera, o escasso derivado do Ibiza com uma história agitada

Produto de uma história financeira frenética que inclui o reposicionamento da SEAT nos anos oitenta e a criação de uma empresa independente na costa andaluza, o Aníbal Podadera é o modelo mais lembrado do seu criador Francisco Podadera. Um carro cheio de histórias interessantes que, além disso, hoje constitui um item de colecionador muito difícil de ver em circulação.

Na história do design automotivo na Espanha, são poucos os nomes recorrentes ligados a peças únicas ou modelos de curta duração. Nesse sentido, possivelmente o mais lembrado é o de Pedro Serra. O construtor de carrocerias de Barcelona ligado à trajetória do Z-102. Embora também responsável por muitas intervenções nos modelos SEAT e até Aston Martin ou Dodge. Tudo isso sem contar as curiosas linhas que ele concebeu para o Biscúter Sport”Pegasina”. Além disso, indo a tempos um pouco mais passados, encontramos Agustín Masgrau. O designer da ENASA, que sob a supervisão de Wifredo Ricart criou o futurista Z-102 Berlina Especial Le Mans 1953.

Mais conhecido como Pegaso Cúpula, que ainda surpreende por suas interessantes soluções aerodinâmicas. No entanto, focando em anos mais próximos do presente, é impossível não parar nos anos oitenta com a trajetória de Francisco Podadera. Engenheiro aeronáutico formado em desenho industrial no California Art Center, pode ser alcançado a partir de veículos muito diferentes. Para começar, os fãs de modelos industriais certamente se lembrarão do Pegaso Solo de 1989. Um protótipo que parecia algo saído de um filme de ficção científica. Com seus volumes geométricos e superfícies polidas rematadas com aquelas calotas lenticulares de inspiração futurista.

Sobre o mundo das duas rodas, Francisco Podadera pode ser rastreado graças ao Lambretta 200 projetado em 1986. Uma scooter simples e funcional mas dotada de uma estética muito típica dessa década. Visualmente refinado, com formas retilíneas para caber a maior parte de seus volumes.

De qualquer forma, a verdade é que tratava-se de um turismo onde este designer ganhasse mais reconhecimento e memória. Conversamos sobre seu trabalho em 1986 com o Ibiza Raider. O protótipo que procurava dar uma variante lúdica e exclusiva à gama daquele utilitário apresentado apenas dois anos antes.

No entanto, foi também o início de uma complexa aventura empresarial. Lançado pela recusa da Volkswagen em produzir em massa o Raider dentro da gama SEAT. Fato que provocou a separação de Francisco Podadera em relação à marca espanhola. Decidindo dar o salto para o mundo dos negócios fundando suas próprias oficinas Aníbal PaccarCorp SA na cidade de Motril, em Granada. Uma história repleta de design automóvel mas também de difíceis vicissitudes financeiras, constituindo uma das iniciativas mais breves - mas também mais intensas - da história recente do desporto motorizado nacional.

ASSENTO, TESOURA DE PODA E O FATOR VOLKSWAGEN

Embora a SEAT tenha sido o carro-chefe indiscutível da indústria automobilística na Espanha, isso começou a mudar na segunda metade dos anos setenta. Afetada pela Crise do Petróleo e pelo aparecimento de concorrentes como o Ford Valencia Body & Assembly inaugurado em 1976, a SEAT sofreu uma queda acentuada nas vendas. Além do mais, a chegada da democracia à Espanha anunciava finalmente a sua iminente integração no mercado comum europeu. Uma situação para a qual o Estado teve que enxugar sua estrutura econômica. Liberalizar e privatizar grande parte do setor público no que iria implicar um ambicioso processo de reconversão industrial.

Assim, em 1979 o Estado espanhol assinou o chamado Pré-Acordo de Integração com a FIAT de Agnelli. Com base nele, previa-se a absorção total da SEAT pelo gigante empresarial italiano, culminando o que era a sua aliança estratégica desde a década de XNUMX. Porém, na Itália este acordo não foi visto com bons olhos. Em primeiro lugar, os efeitos da recessão econômica também se faziam sentir naquele país. Algo ainda mais visível no setor automotivo, aberto aos altos e baixos do mercado livre com cada vez mais empresas oferecendo suas gamas ao consumidor.

Um contexto problemático onde os sindicatos temiam a perda de empregos na FIAT, pois teve que recapitalizar a SEAT na Espanha. Esta preocupação foi acompanhada pela gerada no departamento de contabilidade do grupo, onde As demandas financeiras do Pré-Acordo de Integração também não foram vistas com bons olhos.. Com tudo isso, a FIAT se desvinculou do que foi firmado ao vender suas ações ao Instituto Nacional da Indústria pelo preço simbólico de uma peseta e assinar o Termo de Colaboração. Documento pelo qual a FIAT permitiu que a SEAT continuasse a fabricar os projetos acordados até 1986.

A partir daqui a SEAT começou a trabalhar contra o relógio, já que com a retirada da casa italiana toda a secção técnica também saiu. Dessa forma, a única maneira de sobreviver era começar a criar seus próprios modelos o quanto antes. Um esforço enorme que não poderia ser realizado sozinho, muito menos nas difíceis condições financeiras da época. Chegados a este ponto, A Volkswagen surgiu em 1982 com os primeiros acordos de transferência de tecnologia. Depois disso, alguns meses depois, o grupo alemão adquiriu quase metade das ações da SEAT. O processo culminou quando, no final de 1986, foi feito com 75% deles.

E é aqui que chegamos ao ponto que liga este complexo contexto financeiro com o Ibiza Raider de Francisco Podadera. Já que foi precisamente em 1986 que o designer finalizou os esboços onde finalmente pôde ver como seria aquele protótipo. Casual e com certo toque esportivo, o Raider Fui chamado para ser um modelo de reivindicação. Uma espécie de declaração de intenções destinada a melhorar a imagem corporativa do novo SEAT. Exatamente o que, no marketing automotivo, é chamado de modelo halo. Produzido em tiragens curtas, certamente pouco lucrativo em termos de vendas, mas extremamente eficaz em termos de publicidade.

Com esta aposta na mesa, era a direção da Volkswagen da SEAT quem deveria decidir sobre o futuro do Ibiza Raider. De fato, pelo menos um protótipo já havia sido feito nas instalações da Carrocerías Barber em Teruel. E bem, infelizmente o veredicto foi negativo. Longe de avaliar o que teria implicado essa criação de Francisco Podadera, o grupo alemão preferiu não trazer um modelo exclusivo como este para o mercado. Apostando em colocar a SEAT numa alternativa económica e funcional dentro das suas marcas, tornando-a num fabricante focado em modelos práticos e simples para os segmentos B e C. No entanto, a ideia do Raider não morreria aqui, tornando-se a base do futuro Aníbal Podadera.

DE IBIZA RIDER A ANÍBAL PODADERA, A HISTÓRIA DO NEGÓCIO

Após a recusa do SEAT gerido pela Volkswagen, Francisco Podadera decidiu dar o salto do design automóvel para o mundo empresarial. Dessa forma, pensou em fazer do antigo Raider um modelo comercializado por ele mesmo. Calculando que isso poderia ter um nicho aceitável no mercado espanhol no momento. Afinal, não foram poucos os construtores de carrocerias italianos que fizeram suas próprias criações de forma popular, voltadas para um público que buscava o espírito esportivo sem muitos benefícios. Um carro diferente e diferenciado, com o qual desfrutar de condução em ambientes de lazer tranquilos.

Exemplos disso foram a Pininfarina Azzurra ou a Moretti Targa, construídos respectivamente com o FIAT 124 e 128 como base. Assim, Francisco Podadera centrou sua base de operações por um tempo em Madri. Colaborando com o Centro de Desenho Industrial de Madrid CEDI-MA no projeto Aníbal apresentá-lo publicamente em ato realizado no Mercado Puerta de Toledo. Por fim, parecia que tudo começava a tomar forma, embora, na verdade, a importante questão da cadeia produtiva permanecesse por resolver.

Neste ponto, Francisco Podadera olhou para o sul da Península -mesmo sendo nascido em Tetuán, tinha raízes em Málaga- para buscar ajuda do Instituto Andaluz de Desenvolvimento (IFA). Um organismo público dependente da Junta de Andaluzia, através do qual se conseguiu a transferência de terras perto da cidade de Motril, em Granada, em troca da contratação de pessoas com necessidades de trabalho. Aninhado no que é atualmente, curiosamente, uma zona repleta de oficinas e concessionários automóveis. Desta maneira, em 1990 a produção do Anibal Podadera começou com uma equipe de cerca de 17 trabalhadores. Em relação à produção estimada, algumas fontes apontam para a ideia otimista de ter conseguido chegar até mil por ano com o mercado europeu na mira. No entanto, o número total de unidades da Aníbal Podadera era de apenas 83, e a empresa foi liquidada em 1992.

Mas porque? Bem, do ponto de vista do marketing, é justo salientar que não foram poucos os concessionários SEAT que ofereceram este modelo. Além disso, a publicidade enfatizou um público principalmente litorâneo que buscava o diferenciação com um carro de design exclusivo. Bons pontos de partida, embora tivessem que lidar com um preço premium de 50% em comparação com as unidades da série usadas como base. Dessa forma, por esse custo, o design do Aníbal Podadera teve que ser valorizado o suficiente para deixar de considerar outras opções mais de desempenho. Ótima série, sim.

No entanto, o verdadeiro obstáculo à sobrevivência do projeto empresarial iniciado por Francisco Podadera não veio tanto dessas razões, mas da problemas profundos de gerenciamento e homologações. Também a lacuna entre suprimentos e receitas, bem como muitos obstáculos recorrentes no início de qualquer empresa, levaram a um fim súbito e complexo. Razão pela qual ainda hoje o designer prefere permanecer no silêncio procurado e calmo de seu retiro cordobes.

E é que, desde aquele 1992, as aparições públicas de Francisco Podadera têm sido realmente escassas. Claro, ele nunca se separou do mundo do design industrial. Poder ver como tem veículos autografados destinado a pessoas com mobilidade reduzida e até uma bicicleta elétrica como o trabalho mais recente no próximo ano 2020. Além disso, para seu crédito, havia também dois tratores Ebro Kubota e até uma edição especial do Marbella, da qual apenas nove unidades foram fabricadas. Na verdade, já estamos investigando em busca de algum sobrevivente.

PELO MENOS DOIS MODELOS PARA O MESMO VISUAL

Como designer, o trabalho de Francisco Podadera no Ibiza focou-se na estética. Sacrificar a habitabilidade dos bancos traseiros característicos do modelo de série para criar aqui um 2+2 com raízes claras dos anos oitenta. Nesse sentido um dos detalhes que mais chama a atenção é a incorporação dos faróis retráteis. Acabamento com a mesma carcaça do Porsche 924, sendo uma das peças retiradas de outros carros, como o vidro traseiro do SEAT 127.

Quanto às linhas gerais, estas diferem bastante das do Ibiza. Desta forma, a frente fica totalmente irreconhecível, sendo no Aníbal Podadera muito mais baixa, aerodinâmica e estilizada. Uma estética desportiva que é ajudada pelas saias e pelas cavas das rodas ligeiramente destacadas já presentes na segunda geração do mesmo. Além do mais, a queda abrupta do vidro traseiro logo atrás do pilar B -reforçado com um roll bar- acentua um curioso caráter coupé de três volumes muito no estilo do Toyota MR2 da época. Se somarmos a isso o uso profuso de fibra de vidro nos painéis e, portanto, a redução de peso -890 quilos-, ficamos com um modelo mais esportivo do que se poderia pensar a princípio.

Algo bem sintetizado nas palavras do próprio Francisco Podadera. Quem em entrevista ao Motor16 declarou que queria oferecer um modelo"distinto“pero”simples”. Por isso, comentou que “para o conseguir, parti de um carro de produção com um motor e design particularmente bons, o SEAT Ibiza, que uma vez reduziu o seu peso e melhorou a sua aerodinâmica converte em um pequeno Porsche para diversão de entusiastas de carros que não necessariamente têm grandes contas bancárias".

Um bom resumo do modelo, trazendo adequadamente a referência à Porsche já que a mecânica desses Ibizas respondia à família de motores System Porsche projetados para a SEAT. De fato, o Aníbal Podadera era geralmente oferecido em duas versões. O F90, com mecânica de litro e meio, carburação e 90CV equipado no Ibiza GLX e no F100. Isso já com injeção eletrônica e os 105CV fornecidos pelo Ibiza SXI. Isso sempre tendo em vista que, em um carro com um grau tão alto de fabricação, há consciência de unidades com certas especificidades que podem estar fora das denominadas F90 e F100. Além disso, surgiram ideias sobre a possibilidade de criar versões conversíveis e até uma com mecânica turbo.

Planos que, infelizmente, ficaram no tinteiro com o fechamento produzido em 1992. Apenas um ano após a primeira atualização do Ibiza. Conhecido como Novo Estilo e no qual se basearam várias unidades da Aníbal Podadera. Em relação ao equipamento, o Hannibal teve um flyer criado especificamente para ele por Momo. Um detalhe exclusivo que foi ao som das rodas de quatorze polegadas e o emblema da marca com um design claro típico dos anos oitenta. Tudo isso culminou em uma gama de três cores, já que apenas branco, vermelho e preto foram oferecidos para a carroceria.

Assentos Recaro no mesmo estilo dos montados no Golf G60 foram incluídos como opção. Características que tornaram a criação de Francisco Podadera a mais interessante se procurava um carro exclusivo de fabrico nacional. Aliás, hoje essa é uma de suas maiores atrações entre os colecionadores. Tendo conquistado prestígio não só pela sua história, mas também pela sua escassez. Afinal, estima-se que restem apenas 12 ou 15 unidades em circulação. O que faz do Aníbal uma estranha amostra do automobilismo nacional. Reunindo em seu caminho olhares que especulam sobre o que poderia ser e outros que não dão crédito para ver, enfim, um em movimento.

E é que esta criação de Francisco Podadera é um dos modelos mais atraentes e enigmáticos da história recente da nossa frota. Um modelo sobre o qual ainda temos algumas dúvidas e uma grande certeza: sua história é tão trágica quanto viciante. Muito interessante.

De La Escudería queremos agradecer aos irmãos Antonio e Miguel Ángel Mora Romero a excelente disposição que tiveram para conosco, concordando em passar uma manhã agradável com eles em que pudemos aprender em primeira mão uma infinidade de dados sobre o Aníbal Podadera em geral, e sobre a unidade de sua coleção em particular. Em excelente estado de conservação, como pode ser visto nestas fotografias tiradas na costa de Málaga por José Antonio Sánchez. 

Fotografias de José Antonio Sánchez.

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Escrito por Miguel Sánchez

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